44th

A [minha] fé ecumênica e nem sempre divina do ano passado deu um jeito de abençoar alguns dos meus delírios num improviso que só o jazz sabe fazer com elegância. E fez. Aos trancos. Aos barrancos. Aos berros. Aos sussurros. Num absurdo que nem sei. Num amontoado de emoção que sinto na pele que arrepia até depois que passou, que acabou, que se fez fim pra começar outro improviso ainda mais cheio de propósito e instinto. Acontece que é um tanto difícil assumir compromissos e não falhar mesmo planejando cada acorde, cada passo, cada conversa com afeto e cuidado. É como fazer uma playlist chamada “como destruir a vida em alguns riffs” e colocar aquela música que sempre fez parte da felicidade num lugar que não deveria. Não era para ser. Estraga tudo. Talvez por isso a gente se decepciona tanto com as frágeis promessas das pessoas. A gente acredita, sabe. A gente é fiel quando aquela música que trazia leveza passa a machucar e a muda de lugar. Já as pessoas não. Elas vão te foder enquanto sorriem e dizem que tudo vai ficar bem da maneira mais decepcionante possível. Ou, quando não são decepcionantes, nem irrelevantes, morrem por algum absurdo qualquer que te faz paralisar por medo, tristeza, descrença e sustos. 

É por isso que aos 44 do primeiro tempo o jazz faz todo sentido. A gente vai lá e improvisa com elegância – coisa que aos vinte e poucos ou tantos não se faz por falta de milhas de céus, chãos e amores possíveis ou não. Continuo sendo a vizinha que dança descalça na sala com ritmo e sem pudor, mas daqui por diante talvez eu improvise um tanto para desespero de uns, para o deleite de outros. Só escolher quem você quer ser que a gente faz a carteirinha de sócio do clube “Jazz do coração” batizado nos versos de Ana Cristina César. 

A rubrica é pele.

 


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