38th
Sou ritual. Uma
imensidão deles que inventei a cada temporada. Um hábito necessário de
prolongar o que sinto em cada pegada na areia, a cada quentura do asfalto, a
cada tato que me pede calma de uma calma que não tenho. Hoje meu ritual é de
busca. Do que eu vou ser quando crescer além do que é agora. Do que eu vou
querer além dos quereres que se perdem de mim por descuido ou preguiça. Para o lugar
que [me] é família como forma de continuar e ganhar, ainda que haja algum
descuido, ainda que sofra de alguma preguiça.
Talvez depois disso
eu vá morar em algum lugar do velho mundo ou vire uma sulamericana de vivência
e presença. Talvez eu case, tenha filhos, ou me aliste para o Médicos Sem
Fronteiras e passe uma temporada mergulhada em um caos que [me] precisa. Talvez
eu não volte e fique por lá, não para sempre porque para sempre é muito tempo,
mas por tempo suficiente para entender que raiz é onde a gente está. Talvez eu
volte rápido e peço ao rapaz que desafia o meu bom senso em namoro. Talvez eu
fique para prolongar o afeto mais recente e resolva pagar pra ver qualéqueé do
que parece poder ser um bom amor. Talvez eu pegue aquela ideia engavetada e a
transforme em alguma grande coisa. Ainda não sei qual talvez que eu vá
escolher, mas todos eles me parecem algo bom de viver. Porque é escolha. Porque
me dá vontade. Porque é de todo prazer. Porque tem bem-querer.
E antes de continuar
o que é “daqui pra frente” preciso dizer que escolher ficar por aqui hoje e
marcar passagem só de ida para algum lugar é na verdade um desses exercícios
para chegar mais perto das histórias que não são minhas por direito, mas são
por herança – um tipo de genética construída por desavenças provençais e amores
românticos, por fugas de cordel e encontros compadecidos. E preciso ir
acompanhada por uma trilha sonora em língua toda portuguesa, brasileira, de
sotaque que arrasta pericárdio. Como diria Bethânia, na carta [mais honesta] de
amor, que leio e escuto pontualmente como oração, descobri que “sou como a haste fina: qualquer brisa
verga, nenhuma espada corta.” – Acho que é isso que me faz querer ir para,
quem sabe, voltar [e fazer, ser, receber...] melhor.
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