COMO FAZER UMA POESIA
Sinta. Finja se não
for possível sentir, mas finja ou sinta muito. Comece pelas beiradas, sem se
preocupar com a rima. Ela não exige precisão. Ela não exige nem a própria
presença. Deite a palavra caso ela resista prepotente, mas não exija dela tanta
obediência. Se estiver com raiva, tudo bem. Faça dela sua melhor aversão ao que
quer que seja e a atinja com a palavra em ponta de faca. Se for medo, esconda vocabulário
nas mangas da blusa como se suas mãos estivessem com frio. Teste uma, duas,
três vezes se for preciso. Uma hora ele será verso inteiro, significante e temido,
talvez não mais por você, mas para quem te fizer oratória. O medo tem dessas
coisas de fazer a gente gritar em silêncio a aflição do outro. Se for amor, tente
não rejeitar o ridículo. Ele vai acontecer [você admitindo ou não]. E quando
ele deixar de ser apenas derramamento e te desafiar, você saberá onde colocar
cada palavra. Vai continuar sendo só seu, mas olhar o outro além do ângulo ao
redor faz a gente reconhecer lugar além do comum. A partir daí, é apoderamento.
Porque poesia é coisa que a gente toma [quase sem coragem] emprestado e depois,
por sentir e sentir muito, não devolve mais.
Comentários
Postar um comentário